Eu no metro e ela ao meu lado. Ploc ploc. Com um daqueles casacos de plástico enchido que deviam ser proibidos. Porque é que as pessoas gostam de andar na rua como se estivessem enroladas num endredon? E a música muito alta, mas não alta o suficiente para eu entender qual é. Apenas o volume necessário para que eu ouvisse o ritmo, só o ritmo, meio hip-hop, meio kizomba, um ritmo que me fez olhar para ela de lado e sobrancelhas franzidas. E ela "ploc ploc". A pastilha elástica a estalar dentro da boca. Incessante. Ploc ploc ploc ploc. E eu a ler a mesma frase sem parar e sem conseguir avançar: "Virou-se para lançar um olhar à margem oposta". Um senhor senta-se à frente da mulher-edredon e vejo no seu subtil levantar de queixo que se arrepende quase no mesmo instante. Ploc ploc. Na minha retina "Virou-se para lançar um olhar à margem oposta" e tenho tempo para pensar que margem é uma palavra bonita e que o Natal está aí e quase não dei por ele e que o homem do livro se virou para lançar um olhar à margem oposta. E a outra, ploc ploc. Aquilo já atravessou os ouvidos, já está no centro do cérebro, como um martelo, ploc ploc ploc. É aí que me levanto, me viro para ela, puxo-lhe os cabelos com madeixas duvidosas e lhe digo: "estala lá a pastilha agora, minha cara de cu vestida de colchão, estala lá se queres ver, puta!"
Fui Ally McBeal naquele momento. Abano a cabeça e pisco os olhos que nem por um momento se desviaram daquela frase e a rapariga, impávida e serena, ploc ploc, sai no Jardim Zoológico.
Gema: Porra! Vale a pena ganhar este concurso só pelo prémio. Morri de inveja. Clara: Nem reparei. Qual é o prémio? Gema: Tinhas de ver, dito não é tão bom como ao ver as imagens. 6 meses na London Music School, a viver num condomínio de luxo. Clara: A mim soa-me muito bem, mesmo por sms!! Porque é que eu não concorri a esta merda? Mas eu não tenho o cabelo comprido, não passava. Gema: Pois é, sem cabelo comprido não dá. Eu já tenho uma franja, talvez me safasse. Clara: LOL, sim tu tinhas mais hipóteses. Como é que não havia de sair aquela? Com aquele vestido azul-piscina, eu também não conseguiria cantar!
Empiricamente comprovada. Surgiu-me no meu cérebro de cientista social / miúda sem muito em que pensar (excepto trabalho sem fim, aulas de espanhol, aulas de ballet, família, amigos, ainda bem que não tenho namorado, oh céus, nunca pensei dizer isto), após notar determinadas subtilezas do comportamento masculino. Mais uma vez, mulheres desvendam os infindáveis sinais corporais do sexo oposto.
A hipótese (que não se deve pôr na negativa, mas que se lixe, também não sou assim tão cientista) era:
Mulher, um homem não está atraído por ti quando, ao te abraçar, te dá palmadinhas nas costas.
Observação no campo e várias experiências (não propositadas, na verdade) permitem-me afirmar que esta hipótese pode agora ser considerada um facto científico. Reparem lá e depois venham dizer-me que não tenho razão.
Nota: Atenção que eu não disse que, quando um homem abraça decentemente, está atraído por ti, mulher. Relax, não inventes já histórias de amor onde elas não existem.
Nota 2: Ao contrário do que é habitual na minha depressiva pessoa, este estudo não advém de nenhum interesse particular nem comprova um qualquer desgosto amoroso. É apenas o meu eu observador em funcionamento.
Queria roubar as palavras do Peixoto. Queria roubar e roubei. Acho que sentimos os dois da mesma forma. Ele escreveu. Eu roubei. Uma divisão justa, parece-me. E Madrid ficou tão bem na fotografia.
Madrid regressará sempre. São precisos anos para aprender aquilo que apenas acontece com a distância de anos. É por isso que posso afirmar que Madrid regressará sempre. Não sei que tipo de entendimento encontrámos. Eu e Madrid não nos conhecemos bem. Sabemos o essencial e inventamos tudo o resto. Tanto a minha vida, como a vida de Madrid, já tiveram muitas formas. No entanto, quando nos encontramos, somos sempre o mesmo nome. Avaliamo-nos por cicatrizes e pequenas marcas de idade. Não estabelecemos metas, estamos cansados. Eu e Madrid só queremos uma cama, mas, se não houver, contentamo-nos com o chão e, se não houver, contentamo-nos com um abraço.
...'cause I'm going to Strawberry Fields Nothing is real and nothing to get hung about Strawberry Fields forever
Living is easy with eyes closed, misunderstanding all you see It's getting hard to be someone but it all works out It doesn't matter much to me
No one I think is in my tree, I mean it must be high or low That is you can't you know tune in but it's all right That is I think it's not too bad
Always know sometimes think it's me, but you know I know and it's a dream I think I know of thee, ah yes, but it's all wrong That is I think I disagree
Let me take you down 'cause I'm going to Strawberry Fields Nothing is real and nothing to get hung about Strawberry Fields forever