terça-feira, 31 de agosto de 2010

Cheiro de livro novo


Já agora, no El Corte Inglés está com 10% de desconto. E na Wook também. E na Fnac também, com cartão aderente. A utilidade do preço inicial é uma incógnita. Como ainda não li, por enquanto são estas as considerações que tenho a fazer sobre o livro.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

De Portimão a Lisboa são... 6 horas de distância?



Desci as escadas e senti a noite de Verão transformar-se. O vento que me levantou os cabelos já não era morno, mas fresco, capaz de eriçar os meus pêlos dourados pelo sol. Olhei em volta: uma estação de serviço, igual a tantas outras, numa zona de planície. Nenhum outro veículo estava estacionado ali próximo; o autocarro de onde tinha acabado de sair parecia um erro de cenografia, ali no meio de nada. Peguei na minha mala, afastei-me uns passos e pousei-a junto aos meus pés. Perguntei a alguém que passava: "Onde estamos?". A resposta: "Em Grândola".


Eu pensei que este fim de semana fosse mudar a minha vida. Não dessa forma tipo livro de auto-ajuda, "como dois dias no Algarve fizeram de mim a mulher feliz que sou hoje", nada disso. Simplesmente, dormi no mesmo quarto que um bebé e uma criança pequena, o que implicou acordar ali por volta das 7 da manhã e levantar às 8, para acompanhar os pais dos petizes no pequeno-almoço. Eram 23h de sábado e eu já estava a cair de sono (coisa que não acontecia desde 1994, sensivelmente). Pensei, "bom, vou aproveitar este novo ritmo, domingo deito-me cedinho, segunda levanto-me cedinho e posso tomar o pequeno-almoço sentada, comer fruta, ir comprar o jornal, fazer a cama como deve ser e essas coisas de mulher ajuizada".

Ora, do pensar ao fazer vai uma grande distância, principalmente quando o universo se interpõe entre nós e a nossa vontade. O expresso já saiu de Portimão dez minutos atrasado. Não ignorei o mau augúrio, mas não havia nada que pudesse fazer. A meio do caminho, o autocarro seguiu uns poucos quilómetros por entre a escuridão meio fora meio dentro da faixa de rodagem. Imaginei um motorista a adormecer e a viatura a resvalar pela encosta abaixo e os passageiros todos perdidos no meio da selva alentejana, a caçar javalis e a carregar numa tecla de computador e sei lá mais que coisas perigosas. Devagar, lá entrámos na estação de serviço de Grândola, vila morena, terra da adversidade, e o motorista deu a triste notícia: o autocarro estava avariado. A mecânica é quem mais ordena dentro de ti, ó cidade. Depois de entrarem uns quantos passageiros nos dois últimos expressos que ali passaram, percebemos que teríamos de esperar que fosse uma nova viatura de Lisboa de propósito. "Isto ainda vai demorar pelo menos umas duas horas". Bonito.

Foram duas horas e meia de espera em Grândola, que incluíram a compra de uma empada e um pacote de Fritos e a leitura de um livro. E aqui aconteceu algo importante. O avanço no livro foi possível apenas e só devido à minha ridícula caneta com uma lanterna na ponta. É que a luz mortiça do autocarro no breu da noite não chegava para os meus olhinhos e foi aquela característica da caneta, antes desprezada e gozada, que permitiu que o tempo passasse mais depressa.

Conclusão: em vez de chegar a Lisboa às 23:30, cheguei quase às 3 da manhã. O meu deitar cedo e cedo erguer foi por água abaixo.

Moral: nunca desprezar as pequenas características diferenciadoras de um objecto quotidiano. Mais dia, menos dia, também você vai precisar daquela luzinha azul na ponta da esferográfica.

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Post de Verão

Sabem aquelas cenas de filme em que moças muito jeitosas saem de uma mota, tiram o capacete graciosamente em câmara lenta e sacodem o cabelo sedoso com o sol a bater na face de lábios entreabertos?
Pois, garotada, isso não existe. É tudo efeito especial. Ou então ela usa um capacete muito largo. Quem anda de mota, sabe do que falo. Aqueles capacetes à séria, completos, não se colocam nem retiram com facilidade. Não. Eles são bem apertadinhos e deixam as bochechas esmagadas. Para tirá-los, é preciso alguma brusquidão e o cabelo vem atrás, todo cheio de electricidade. A cara fica com as marcas da tecido interior, principalmente se estiver calor.

Com isto quero dizer que essa coisa da mulher 100% sexy só existe nos filmes. E porque eles filmam várias vezes a mesma cena. E editam. E põem efeitos especiais. A pessoa normal não anda por aí a semicerrar os olhos pela rua e a fazer coisas em câmara lenta (até porque seria patético).

Aquela jovem loira e recauchutada chamada Bastet, por exemplo, disse que fazia a lida doméstica toda nua e de saltos altos. Please. São criaturas como esta que lixam a vida às outras mulheres, porque os jovens machos andam por aí a acreditar que isto existe mesmo, que é possível, que nós é que não nos esforçamos. E, verdade seja dita, fazer-se de sexy é tão pouco sexy.

Há realmente senhoras que transpiram sensualidade, naturalmente. Mas também cortam as unhas dos pés e tiram o buço, disso podem ter a certeza.

Bonito, bonito, é um homem ver sexyness em cada gesto de uma tal mulher, em cada passo quotidiano, em cada encolher de ombros corriqueiro. Mas isso, caríssimos, já é paixão.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Foi assim que me vi a perder a esperança na minha irmã (e na lixívia)

Barata na garagem. Gigante. Viva e antenada.

Onde é que falhaste, irmã? Que cano te escapou? Que dedicação te faltou? Que lixívia secou? Que barata ruim resistiu à tua arma líquida e ficou apenas com uma grande moca e uma ressaca daquelas pela manhã?

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

"They tell me not to go to Cité Soleil...

...but how can I be scared of people like me?" *


O músico Wyclef Jean apresentou oficialmente a sua candidatura à presidência do Haiti (notícia aqui). Para quem não sabe quase nada sobre a tentativa de país que é o Haiti, isto pode parecer estranho. Como ele próprio diz, "as pessoas vão perguntar: "Meu, o que é que ele sabe de política?". Muito pouco.
A questão aqui é que o Haiti talvez não precise de políticos agora. Provavelmente, precisa mais (e urgentemente) de uma inspiração e, se pensarmos assim, a candidatura do Wyclef Jean faz todo o sentido.

Estas ideias tornam-se lógicas, depois de ver este filme:



Ghosts of Cité Soleil é, quase certamente, o melhor documentário que já vi (atenção, apesar de documentário, é cinema. Ou seja, tem uma história construída, tem edição, não é o espelho de toda a realidade). A Cité Soleil, situada em Port-au-Prince, no Haiti, é considerada o sítio mais perigoso do mundo. Embora facilmente comparável às favelas brasileiras, põe-nas a um canto. É um país dentro de um país, dividido por zonas, cada uma delas controlada por um líder. Como sempre acontece, mesmo o mais tirano dos líderes tem o poder que o povo lhe confere (de forma mais ou menos consciente) e estes têm todo o poder, materializado em armas, droga e outros "tesouros" ilegais. É que estes gangsters são capazes de ir entregar um maço de notas a uma mulher e dizer-lhe "toma, para pores os teus filhos na escola". Já o governo, não entrega nada ao povo, pobre como não sabemos o que é ser pobre (é o país mais pobre da América, quase metade da população é analfabeta e está a recuperar de um terramoto que destruiu cerca de 80% da capital) e gasta o pouco que tem em guerra, cargas policiais e sustento de ditaduras.
A esperança reside no facto de metade dos haitianos terem menos de 26 anos. E quem é o ídolo dessa juventude? Wyclef Jean, claro, rapper interventivo, nascido no meio deles. É um deles.
Para quem ainda acha que a arte é só para quem não tem mais o que fazer, repense. Aquelas pessoas desistiram de depositar esperança nos políticos; as circunstâncias obrigaram-nas a acreditar em gangsters. A ideia de que a salvação do Haiti pode estar nas mãos de um músico, de repente, já não parece assim tão estranho. Pois não?


Veremos o que acontece daqui para a frente.


PS.: O Sean Penn diz que o W. Jean desviou dinheiro de doações. Mas o Sean Penn dá porrada nas mulheres. Não conta.

*Retirado de Ghost of Cité Soleil, canção de Wyclef Jean para a banda sonora do filme.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Um dia vou apagar as tuas mensagens.


Hoje foi o dia.

Foi assim que vi a minha irmã perder a esperança

Hoje acordei e levantei-me mais cedo do que o costume (ó dor), mas não demorei a perceber que estava mesmo acordada. Cheguei à casa de banho e deparei-me com a minha irmã ainda de pijama, com uma fita vermelha mais velha que eu a segurar o cabelo todo, a tentar abrir um frasco de lixívia de dois litros. Na bancada, estava outro, já vazio. Olhou para mim com uma expressão a roçar o pânico.

- "Eles", começou, referindo-se àquela entidade desconhecida que sabe uma data de coisas, como o tempo para amanhã, "eles estão a mandar pôr lixívia nos canos. Vai haver uma invasão de baratas em Lisboa".

Estive quase para a lembrar de que ali em Alfornelos já não é Lisboa, mas vi-a tão aflita que só consegui apontar para a sanita e dizer: "põe aqui também". Ela continuou na azáfama de abrir a lixívia, já com a ajuda de uma tesoura, e, muito concentrada, deitou o líquido no lavatório, na banheira e na sanita. Depois de trabalho pronto, parou dois segundos a olhar em silêncio. A última coisa que disse antes de partir em busca de outros canos saiu já em tom desesperado.

- "Como se isto as impedisse".

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

0º, temperatura interna

Este domingo, aconteceu o primeiro banho de mar do ano. Já tinha dado um mergulho, mas só isso: um mergulho. Até agora, a praia recebeu-me sempre com água gelada e bandeira vermelha. Mas este domingo, esperava-me um mar calmo e transparente.
Cheguei-me à beira-mar. Água muito fria. Exactamente o que eu precisava. Entrei e mergulhei.
Lá em baixo, só o corpo a ficar em pele de galinha, os músculos acordados e o silêncio.
Saí de novo para o sol e o cérebro voltou a funcionar a mil. Tudo a chegar à memória. A lembrança daquela segunda-feira de desilusão, em que me senti como naqueles empregos em que se é rejeitado por habilitações a mais. Por momentos, pensei: "e se eu fosse uma surfistinha sexy e burra?". A resposta veio rápida: "não era eu. E prefiro ser assim como sou." Complexa. Um puzzle daqueles de mil peças, que só com tempo e dedicação se resolvem. E não são os que dão mais satisfação?
Lembrei-me do "desculpa" que ouvi e da carícia que recusei. E andei para trás e lembrei-me daquele dia de carinhos escondidos, trocados por baixo da mesa, por trás do banco do carro, a tentar ocultar o que estava estampado nos nossos sorrisos. E desse sorriso, do qual não direi que iluminava salas ou o meu coração inteiro, porque esse sorriso nada tinha de cliché. E das intermináveis conversas à volta dos filmes. E dos abraços, das mãos dadas, dos beijos. E do fim de semana que talvez não devêssemos ter passado juntos. E das intermináveis conversas à volta das nossas diferenças. E da paixão que morreu rapidamente. E do tempo que afinal foi tão pouco. E das palavras doces que agora parecem mentiras.
Mergulhei de novo. Água gélida. Silêncio. A cabeça vazia. E, se pudesse, não saía de lá, desse vazio frio, até que alguém tivesse coragem para enfrentar o puzzle.