sábado, 8 de maio de 2010

Ele avisou




O início de uma paixão é, salvo poucas e disfuncionais excepções, um sem-fim de coisas boas. As qualidades são inúmeras, os defeitos têm graça. Depois, há aquelas características misteriosas, nem boas nem más, fascinantes. Normalmente, são as que mais definem o outro. Normalmente, são as que nos agarram. E têm sempre um lado negro.
O meu amor por ele dura há quase dois anos e meio. Foi no final de 2007 que admiti estar perdidamente apaixonada pelo Rufus Wainwright. O seu jeito diva, as suas piadas e, claro, as suas geniais músicas interpretadas pela sua voz única prenderam-me. Derreti-me quando o seu sorriso branco se abriu e disse "I'm such a princess!"
Este ano, a princesa voltou. E eu, morta de saudades, sentada o mais à frente que consegui. Rufus entrou vestido de negro, preto como o piano, preto como o olho pintado a abrir e a fechar no painel lá atrás. Preto como o novo disco, All Days are Nights: Songs for Lulu. Preto como a alma dessa Lulu, nome para muitas personagens, mulheres tristes, solitárias, insones.
Na primeira parte do concerto, Rufus, the princess, não falou, não deixou que ninguém batesse palmas, fizesse barulho ou entrasse na sala a meio das músicas. Primeira reacção: "que diva! que estupidez!"
Ele avisou.
Quando ele disse que era uma princesa, no Coliseu em 2007, associei isso ao adorável rapazinho mimado, que gosta de receber atenção e visitar o Museu dos Coches. Mas também há o lado negro. A princesa desesperada e altiva, de exigências incompreensíveis, e egocêntrica, tão egocêntrica que não deixa espaço senão para assistir passivamente.
Ao longo das difíceis, fortes e bonitas canções, a indignação acalma, a desilusão dá lugar à aceitação. Afinal, aquilo também é Rufus, aquilo também faz parte dele. Fez-me lembrar de que, quando se gosta, não é só de um bocadinho. É de tudo.
A segunda parte, em que ele surgiu mais leve, de lantejoulas e sorrisos, aquilo que nós melhor conhecíamos, terminou com lágrimas. A morte da mãe pôs assim a nossa diva, que, como é costume, foi na dor que se despiu e se deixou ver tal como é. Foi aí que compreendemos.

Tudo isto para falar do amor. Sei quase nada sobre o assunto. Mas posso garantir com pouca dúvida: se conheces o lado lunar da pessoa que tens ao teu lado e não te mexes um centímetro para longe dela, estás preparado para amá-la.




Para quem quiser saber como foi, aqui.

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