segunda-feira, 2 de novembro de 2009

O resistente


António Macedo disse dele: "começou no tempo das músicas proibidas e acabou no tempo das músicas obrigatórias. Nunca cedeu."

Não confundir com "nunca se deu". Deu-se, e muito, aos seus ouvintes, à música, às novidades, ao seu grande amor - a rádio.

Disse-me ao telefone (dias depois tive a felicidade de o receber em estúdio, ele discreto, eu entusiasmadíssima por conhecer a voz mais bonita de Portugal): "A Radar foi a única rádio onde encontrei espaço para fazer o que quero". E o que queria era só dar a conhecer música, embalar-nos noite dentro com os melhores sons que conhecia, sem nunca se curvar a uma playlist. O que fazia era criar rádio.

O Lobo resistiu a quase tudo.

Adeus, Mestre António Sérgio. A fazer-te companhia levas um pedaço enorme de rádio, que não poderia nunca sobreviver sem ti.

2 comentários:

Anónimo disse...

Foi um dos homens mais importantes da minha vida, o A.S. Há 25 anos, eu, por inteiro absorvido pelo acne e fadado para a cegueira (side effect bem conhecido da masturbação) "zapava" de estação em estação (station to station, D. Bowie) à procura não sei de quê, quando dei de caras com uma porta entreaberta para o coração das trevas - o how soon is now? dos Smiths. Foi um feitiço, um momento de transcendência, a minha estrada de damasco. Ouvi, em transe, e, no fim, a voz do A.S. identificou os culpados. Passados uns dias, já tinha o hatful of hollow; uns mais, já sabia de cor as letras, cada nota. Meses mais tarde (já com o "som da frente" como ritual diário), eu era um "urbano-depressivo" (era o termo, na altura) consumado. A minha vida mudara: a música tinha tido em mim o efeito que entre tantos que conhecia teriam as drogas duras. Acordou a bizarria (estou a ser modesto) até então dormente num adolescente na aparência normal: the skin shed, uma absurda serpente revelou-se. Velha, cansada e comovida, escreve agora isto... Como alguém (rip) dizia, rock and roll can really fuck up your life. Obrigado António Sérgio.

PMD disse...

Não falar daquilo que ele me deu, nem da falta que me/nos faz. Apenas posso prometer uma coisa: o rock n' roll vive e não morre, como um jingle que temos por aqui, e nós abraçaremos de muito e bom grado a responsabilidade de perpetuar o seu trabalho e de dar continuidade ao seu espírito de fazer rádio, livre e no entanto com a obrigação de dar tudo a quem nos ouve.